segunda-feira, 5 de dezembro de 2016

China – Milho versus Soja – Evolução Histórica


Este trabalho é o resumo traduzido e adaptado pela CustodoAgro, do relatório elaborado pela Consultoria DimSums especializada em Economia Agrícola na China.

A China tornou-se uma Economia Agrícola, em torno do binômio Milho-Soja, a exemplo dos Estados Unidos, mas com uma diferença fundamental. Ao invés de realizar a rotação entre os cultivos, os chineses se especializaram na monocultura do Milho, enquanto que quase toda a Soja consumida no País foi sendo substituída pela importação.

O gráfico abaixo demonstra a evolução histórica dos dois cultivos.



A produção de Milho cresceu vertiginosamente desde 1970, ultrapassando o Arroz. Esse crescimento acelerou-se em 2004, quando as autoridades chinesas adotaram Políticas de Fomento, principalmente junto às Províncias do Norte.

A aceleração foi mais rápida entre 2009-2012, quando instituiu-se o Programa de Preços Mínimos (“target price”), voltados para formação de uma reserva temporária sob a justificativa da proteção da “Segurança Alimentar”.

Nos últimos anos, o volume produzido saltou de 110 milhões de toneladas em 2000 para 225 milhões de toneladas em 2015.

Em função da desorganização logística de algumas Províncias, combinada com uma prática de subsídios bastante questionável, verificou-se em 2016 um estoque massivo de Milho com saldos acumulados remanescentes da Safra 2012. 

Entre 2012 e 2016, o Governo Chinês mudou algumas vezes as regras da sua Política de Preços Mínimos, tendo provocado enormes distorções em relação ao Milho Importado.

Na via oposta, a produção de Soja ficou relativamente estagnada durante os últimos anos. Há um fato indiscutível, os Agricultores optaram pelo Milho ao invés da Soja por razões puramente econômicas.

A área de Milho avançou para Terras Altas, substituiu pastagens e invadiu até encostas, empurrando o cultivo para as regiões mais longínquas e frias do Norte.

Entre 2005 e 2015, o incremento da superfície plantada atingiu 11,8 milhões de hectares.

Importante ressaltar que apenas 3 países no Mundo, cultivam mais do que essa extensão (EUA, Brasil e Argentina).

No mesmo período, verificou-se uma redução de 3 milhões de hectares (cerca de 30%) na área que outrora era destinada a Soja.



O implacável crescimento das importações de Soja reflete, à primeira vista, a opção dos Agricultores pelo cultivo do Milho. Entretanto, os fatores que explicam esse espetacular incremento são bem mais amplos e estão diretamente relacionados com a incorporação da proteína animal na dieta de centenas de milhões de chineses.

A primeira importação de Soja ocorreu em 1995.

Em 2016/2017, as estimativas indicam que o volume importado poderá atingir algo entre 87 e 90 milhões de toneladas.

Hipoteticamente, se na área nova, a China houvesse decidido pelo plantio de Soja ao invés do Milho, considerando a produtividade média de 1.700kg/ha, poderia se afirmar que o volume incremental seria de não mais do que 20 milhões de toneladas, equivalendo a menos do que ¼ da quantidade importada atualmente.



Por que escolheram o Milho?

Comparado com a Soja, o Milho produz cerca de 3x mais por hectare. O plantio permitiu que a China atingisse quase que a autossuficiência.

A diferença média entre os rendimentos agronômicos do Milho em relação a Soja aumentou de 189% no ano 2000 para 254% em 2015, de acordo com a pesquisa divulgada pela Comissão de Reforma e Desenvolvimento Nacional.



O gráfico a seguir demonstra a flutuação dos preços do Milho nos últimos anos (base RMB/ton).

 


A produção de Milho foi muito rentável nos últimos anos para os Produtores Chineses. No entanto, os lucros foram diminuindo na medida em que os preços relativos foram caindo.

O aumento nos custos da mão-de-obra no campo (cada vez mais escassa) e o valor crescente dos arrendamentos estão causando desequilíbrios internos. Em suma, está cada vez mais caro e difícil produzir na China.

 

Os insumos agrícolas subiram ao redor de 35% durante o “boom” do Milho. 

O custo da mão-de-obra refletia, no cálculo anterior conduzido pelo Governo, o valor do trabalho familiar que acabava revertendo em Lucro para os pequenos produtores.

Em 2014, o rendimento bruto da produção de Milho caiu fortemente devido a eliminação da Política de Preços Mínimos que dava sustentação para a “reserva temporária”.

Está previsto a implementação de um subsídio para complementar a renda dos produtores. A estimativa é o pagamento de RMB 120,00 por Mu*, compensando em parte o declínio da renda bruta auferida em 2013, época em que os preços atingiram patamares elevados.

·      1 Mu é igual a 666m2 ou 0,066 hectares. A paridade USD-RMB (29/11/16) é de 6,90, nesse sentido o subsídio equivale a USD 260,00/ha.

Tomando como base os preços praticados ontem em Campo Novo dos Parecis/MT (R$ 24,00/sc), o subsídio direto aos produtores chineses de Milho equivale a 53 scs/ha.

Os preços do Milho e da Soja parecem se mover com certo alinhamento na China. Os subsídios para ambas as culturas deverão continuar no limite do “compensatório”.

A maioria dos Analistas prevê uma recuperação modesta para produção de Soja no próximo ano, porém não existe, todavia, um incentivo claro para transferir grandes áreas do Milho para Soja.

Nesse sentido, as Autoridades Chinesas deverão continuar com seus “ajustes estruturais” do lado da oferta, como um mecanismo para reduzir os excedentes de Milho. A instituição da barreira antidumping de 35% sobre o DDGS americano parece confirmar essa premissa.

Muito se comenta de que haveriam milhões de toneladas de Milho deteriorados, sendo que em algumas localidades o problema já teria alçado a categoria de dano ambiental.

Segundo relatos, as Províncias do Norte estariam enfrentando enormes dificuldades para secar e transferir parte do estoque para as Províncias do Sul. Fortes nevascas já atingem a Província de Heilongjiang (principal produtora de Milho e Soja).

Os fabricantes de ração estão aumentando as compras de cereais em razão do maior consumo de carnes no período das Festividades do Ano Novo Lunar.

O fluxo logístico dificultado pelos problemas climáticos tem forçado a formação de estoques maiores do que a média histórica. Essa condição elevou os preços domésticos do cereal, que estaria numa relação de equivalência com o Brasil em algo próximo a R$ 44,00/sc (relação de equivalência) na Província de Heilongjiang e R$ 58,00/sc nos Portos de Guangzhou e Fujian no sul da China.

Em síntese, o cenário de curto-médio prazos indica que a China deverá continuar importando um volume crescente de Soja e priorizando internamente o plantio de culturas que geram um maior volume por unidade de área, como o Milho e a Batata. Esta última, recentemente, passou a ser incentivada devido o alto rendimento agronômico e suas qualidades nutricionais.


sexta-feira, 18 de novembro de 2016

Previsões de Safra - Futurologia ou Manipulação?

Nos últimos meses, depois de termos enfrentado inúmeros problemas causados pela quebra da safra de soja e de milho em diversas regiões do Brasil, o mercado voltou a atenção para o dimensionamento da produção americana e os reflexos que o volume disponibilizado poderia gerar no setor.
A amplitude das apostas sempre é grande, a começar pelo USDA, que é religiosamente seguido por uma infinidade de produtores, indústrias, bancos, fundos de investimentos e analistas no mundo inteiro. 
Cada um possui uma teoria (original ou não) sobre o futuro dos preços.
Interessante é que muito poucos ousam desafiar as predições do “todo poderoso” USDA. 
Aqui no Brasil, pelo que sei, apenas o meu amigo Liones Severo é que tem tido o peito de contestar abertamente os dados vindos dos Estados Unidos, com impressionante assertividade. Há quem o considere um “herege” por isso.
Gráfico Eduardo Lima Porto
Heresia ou não, o fato é que o USDA tem cometido, historicamente, falhas nas suas previsões de safra, de demanda interna e de exportação, assim como na quantificação do estoque final.
Essa última informação, em especial, é relevante para o nosso planejamento produtivo, comercial e econômico, afetando diretamente o comportamento dos preços no mercado internacional.
O USDA já foi obrigado a realizar “ajustes” em diversas situações, conforme demonstra o gráfico acima, elaborado pela consultoria americana AgTraderTalk.
 
Não tenho conhecimento suficiente para afirmar, sem medo de cometer injustiças ou leviandades, que o USDA não detém corpo técnico capacitado, sistemas de coleta de informação confiável ou metodologia adequada para a apuração dos números que o mundo agrícola e financeiro espera com tanta ansiedade.
Também não posso me posicionar em torno de eventuais interesses ocultos do governo americano de manipular informações tão importantes.
Me cabe apenas considerar de forma serena que o USDA também comete erros. Aliás, isso está estatisticamente comprovado.
Se nos Estados Unidos que é o País mais Rico e tecnologicamente avançado do Mundo essa situação é possível, o que dizer então do Brasil?
Recentemente, a imprensa nacional e estrangeira vem repercutindo a visão de alguns renomados analistas e da própria CONAB de que deveremos ter uma Safra “Recorde”.
Supostamente, tais previsões já estariam incorporadas aos preços futuros.
No caso da soja, tem se falado na possibilidade de uma colheita superior a 101 milhões de toneladas.
Com o devido respeito que os noveis analistas merecem, assim como os técnicos que trabalham na CONAB, me permitirei divergir acerca do volume previsto nesse momento específico (meados de Novembro).
Minha discrepância está alicerçada nas seguintes razões:
1)    Incerteza em relação ao clima devido a formação do fenômeno La Niña, tido até agora como de  intensidade fraca-moderada, mas que ainda pode causar algum déficit hídrico no Sul e eventuais excessos pontuais de chuva no Centro-Oeste capazes de reduzir a produtividade;
2)    Endividamento elevado;
3)    Escassez e restrições de Crédito em todas as regiões do País;
4)    Possibilidade da ocorrência de pragas e doenças de difícil controle.
Considero que a Água é o principal insumo da agricultura. Sem ela, ainda que se tenha a melhor tecnologia disponível, o resultado da produção será desprezível ou nulo.
Como não sou meteorologista, não vou me aventurar a discorrer sobre um assunto tão complexo.
Me sinto mais à vontade para tratar do segundo insumo mais importante, que é o Crédito.
Posso dar alguns pitacos sobre os efeitos econômicos causados pelas Pragas e Doenças, mesmo não sendo Agrônomo, já que os últimos prejuízos ainda fazem parte da lembrança de muita gente.
As dívidas de safras passadas e a quebra verificada em 2016 agravaram significativamente a capacidade de Geração de Caixa dos Produtores, sendo consenso que a intensidade do problema adquiriu uma condição muito preocupante em diversas regiões, especialmente no MATOPIBA e no sul do RS, assim como em diferentes áreas do Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais e Goiás.
Desde 2015, verifica-se uma quantidade impressionante de pedidos de Recuperação Judicial envolvendo desde Grandes Produtores a Revendas com faturamento de centenas de milhões de reais. Se a crise não poupou os grandes, desnecessário falar do que aconteceu aos menores.
O alcance em termos de área cultivável é difícil de estimar, mas a julgar pelo porte de alguns Grupos tradicionais, apenas no Estado do Mato Grosso, é possível que a superfície em severas dificuldades financeiras supere bem mais do que 1 milhão de hectares.
A percepção de risco do setor aumentou significativamente.
A indústria de Defensivos Agrícolas e os Revendedores têm assumido boa parte do financiamento de capital de giro necessário para produção de grãos, a partir da concessão do “prazo-safra” configurado através das operações de Barter.
A negociação do passivo acumulado de anos anteriores, muitas vezes sujeito a variação cambial e a juros elevados, somado às exigências de reposicionamento dos limites de crédito constituem um desafio de enorme dimensão.
As Tradings, que também são responsáveis por uma parcela crescente da liquidez na área de insumos e do escoamento da produção, não demonstram estar atuando de maneira muito agressiva em termos de exposição de risco para garantir a originação.
 
Talvez por isso que o percentual de vendas antecipadas até o momento esteja comparativamente menor em relação ao ano passado, embora tenha se verificado nos últimos dias um intenso movimento de fixações por conta da desvalorização cambial.
Não bastassem as chuvas desuniformes, Amigos do Tocantins contaram que a liberação do crédito junto ao Banco do Brasil foi muito difícil e teriam ocorrido diminuições dos limites, inclusive para Produtores de bom histórico.
A título de referência, um desses Amigos está esperando há dois anos pela indenização do Seguro Agrícola e até agora, nada. Comentou que o caso dele não é isolado no Estado.
Reflexões
Existe estoque suficiente de Defensivos posicionados no campo para resolver, em tempo e forma, uma possível demanda emergencial?
Teriam as Indústrias e Revendedores estabelecido um acordo de repactuação das dívidas e a flexibilização dos critérios de concessão de crédito para que não falte insumos na quantidade e na qualidade necessárias?
Destaquei “qualidade” de propósito porque há o risco efetivo de que estoques de safras anteriores estejam com os ingredientes ativos vencidos ou apresentem uma redução da eficiência em função da degradação natural dos seus componentes, das condições de armazenagem, temperatura, etc.
Vou assumir, apenas por amor ao debate, que os graves problemas   tenham sido temporariamente resolvidos, que haja suficiente quantidade de insumos no campo, que as pragas e doenças não venham a causar um dano representativo e que os modelos climáticos garantam que não haverão eventos prejudiciais. 
A partir de uma combinação bem calibrada dos fatores acima, é possível inferir com razoável grau de assertividade que as previsões otimistas da CONAB, reverberadas por inúmeros Analistas e Consultorias, poderão se confirmar.
Politicamente, parece óbvio que a previsão de uma colheita farta favoreça temporariamente o Governo Temer, que anda fustigado por suspeitas de envolvimento nas tramas investigadas pela Operação Lava-Jato e ajudaria a minimizar a percepção de que a Economia não está se recuperando.
Entretanto, há enorme possibilidade de que a CONAB venha a reconsiderar os números anunciados, a exemplo do que ocorre de maneira recorrente nos Estados Unidos.
Se isso acontecer, veremos não só ajustes da oferta e das projeções de estoque de passagem, mas principalmente muita volatilidade e incertezas sobre o comportamento dos Preços Futuros da Soja em 2017.
Nessa linha de raciocínio, contesto também os prognósticos para a produção do Milho Safrinha, tendo em vista o alto grau de interdependência desse cultivo com os resultados auferidos a partir da colheita da Soja.
Se assim não fosse, seria lícito afirmar que os Produtores não dependem do sucesso da Soja para pagar as contas, liberar limites de crédito e se capitalizar minimamente.
Prudência e Caldo de Galinha nunca fizeram mal, ainda mais em momentos como esse.
Podemos nos posicionar com segurança no que diz respeito ao comportamento de curto prazo do Cambio e das Taxas de Juros Internacionais? 
Em que grau estes fatores afetarão a disponibilidade de Crédito e o Fluxo de Caixa dos Agricultores?
De que forma o Setor Agrícola se ajustará para atender aos requisitos exigidos pela Convenção de Basileia III? (vou abordar esse tema em breve).
Poderia elaborar uma série de questionamentos adicionais na tentativa de construir um cenário de relativa consistência técnica para obtenção de um prognóstico razoável da Safra e efeitos subjacentes, ainda assim, com a quantidade de incertezas que pairam no Mundo, me parece que seria um exercício de futurologia, daqueles que se justificam numa mesa de boteco, entre Amigos e sabendo que ninguém se lembrará do que foi dito no dia seguinte.
Reconheço minha absoluta insignificância diante do imponderável e por isso me absterei de oferecer previsões dessa magnitude. 
Não quero ser acusado depois de haver manipulado o mercado no sentido de influenciar movimentos massivos de compra e venda em Chicago, de alterar a programação dos importadores e, muito menos, de ter sido o responsável por falências, divórcios ou coisas piores.

quinta-feira, 15 de setembro de 2016

Fusão Bayer-Monsanto - "Se é Bayer é Mon"

A confirmação da transação de compra da totalidade das ações da Monsanto por parte da Bayer, depois de semanas de boatos e anúncios ao Mercado, ocorreu formalmente no dia 14/09/2016.

Trata-se da formação do maior Conglomerado de Pesquisa, Desenvolvimento, Produção e Comercialização de Sementes.

A fusão das duas empresas potencializa brutalmente o seu poder mercadológico no setor de Agroquímicos, onde ambas já atuam com posições dominantes em relação a diversas moléculas. O impacto dessa união é enorme nos canais de distribuição e cultivos-alvo.

É notória a preocupação das duas empresas com uma forte rejeição por parte do Mercado e sobretudo com eventuais impedimentos regulatórios nos Estados Unidos e Europa, tanto é assim que criaram um site específico com um nome bastante sugestivo (www.advancingtogether.com) destinado a ressaltar as motivações da transação, os supostos benefícios que a combinação entre as empresas poderá produzir para os Acionistas e para os Agricultores, entre outros detalhes carregados de adjetivos de marketing. 

Nos últimos dois dias, dediquei várias horas à leitura e a avaliação detalhada das demonstrações financeiras das empresas no período de 2015, além de ter analisado atentamente algumas apresentações recentes da Monsanto.

Esse trabalho, que compartilho com os leitores do Noticias Agrícolas, está dividido nos seguintes tópicos: (i) Aspectos Financeiros da Fusão; (ii) Estratégia Comercial da Monsanto; (iii) Implicações no Mercado Brasileiro; (iv) Prováveis Conseqüências de Longo-Prazo; e (v) O que Podemos Fazer diante desse Cenário?

I - Aspectos Financeiros da Fusão

O volume de dinheiro envolvido nesse negocio surpreendeu o Mundo e gerou enorme repercussão.

Segundo as declarações da Bayer à imprensa internacional, a oferta foi de USD 66 Bilhões a serem pagos à vista pela totalidade da Monsanto.

Uma parte substancial desse montante, ao redor de USD 57 Bilhões, virá de um empréstimo “ponte” contratado com um Consórcio de Bancos Internacionais de primeira linha e o restante do valor envolveria a captação de recursos através da emissão de bonds conversíveis em ações.

Ontem me questionaram se não seria a Monsanto que estaria comprando a Bayer, dado que o negocio agrícola da gigante Alemã é menor em faturamento e não tem a importância estratégica que reconhecidamente a empresa Americana possui nesse segmento.

                                                                                                                                    * USD Mil
DRE (Income Statement) - 2015
Monsanto
Bayer Group (Consolidado)
Bayer Cropscience Division
Faturamento Bruto
USD 15.001,00
USD 50.610,53
USD 11.364,96
EBITDA*
USD   4.831,00
USD 11.258,93
USD   2.640,93
% Margem EBITDA*
    32,20%
      22,24%
       23,24%
·          * Paridade ajustada EUR-USD – 1,0931 (30/12/2015)
·         EBITDA – Earning before Taxes, Depreciation, Amortization = Lucro Operacional antes dos   
          Impostos, Juros, Depreciação/Amortização
·          % Margem EBITDA – Indica o Lucro Operacional como % do Faturamento, antes do pagamento   
          de Impostos, Juros, Depreciação/Amortização. Muito indicado para medir a Capacidade de
          Pagamento em financiamentos.

Do ponto de vista dos acionistas da Monsanto significou um tremendo negócio, equivalente a 13,66x o valor do EBITDA de 2015.

No contexto da Bayer, a divisão Agro passará a ter um faturamento combinado com a operação da Monsanto que equivale ao da poderosa área Farmacêutica do Grupo.

O senso comum indica que os financiadores devem estar muito seguros de que a operação não afetará a solvência do Grupo Bayer.

Nesse contexto, claro está que a Bayer tem plena certeza de que obterá o Retorno sobre o Investimento, superando inúmeras barreiras regulatórias, pressões concorrenciais e outros fatores que podem frustrar as previsões mais conservadoras.

Curioso que dentre os critérios de Governança declarados nas demonstrações financeiras de 2015, a companhia adota uma Matriz de Classificação de Risco para medir o impacto financeiro que determinadas decisões da Diretoria podem trazer para a saúde da empresa.

Valores acima de EUR 1.250.000.000,00 (Hum Bilhão, Duzentos e Cinquenta Milhões de Euros) são considerados como de ALTO RISCO e podem afetar negativamente a solidez financeira. Referida classificação estaria de acordo com as regras estabelecidas pela legislação alemã de valores mobiliários (German Stock Act).

As ações da Bayer fecharam há pouco em baixa de 1,94% (15/09/2016), possivelmente refletindo alguma rejeição do Mercado em relação a compra da Monsanto.

Bayer AG ADR
OTC: BAYRY

II – Estratégia Comercial da Monsanto

Separei alguns slides de uma apresentação recente (Maio/2016) feita pelo Presidente/COO da Monsanto no evento 11th Annual Farm to Market Conference.

1) Milho
O quadro abaixo demonstra a inserção global da empresa, sendo a número 1 nos Estados Unidos, Brasil, Argentina e Leste-Europeu. A participação de mercado no Brasil seria de 50%, indicando uma grande relevância competitiva. Na Argentina, há uma posição dominante com mais de 60% do total cultivado.



  
2) Soja
O objetivo da empresa é atingir até 2025 algo próximo a 58 milhões de hectares (quase que a totalidade da área plantada no Brasil e na Argentina).



3) Nematicidas
Uma das grandes apostas é a comercialização de um Nematicida Biológico, denominado “Nemastrike”, cujo objetivo comercial seria alcançar 125 milhões de Acres ou 50 milhões de hectares até 2025. O lançamento dessa linha está previsto para 2018.


  
4) Core Business e Futura Plataforma
O quadro a seguir sintetiza de maneira clara os objetivos estratégicos da Monsanto para os próximos 10 anos.

Chama atenção que a “nova plataforma” de negócios está baseada: (i) no desenvolvimento de alternativas biológicas, como o “Nemastrike”; (ii) numa linha inoculantes avançados que teriam maior resistência à exposição de Agroquímicos e maior capacidade de transferência de nutrientes para as plantas; e (iii) na constituição de uma plataforma digital de acompanhamento dos cultivos através de imagens satelitais e softwares.



III – Implicações no Mercado Brasileiro

É inegável que a Fusão cria uma posição dominante no Mercado de Sementes e de Agroquímicos, cujo impacto começará a ser sentido logo na próxima Safra, assim que os órgãos “anti-trust” nos Estados Unidos e Europa homologuem a transação.

A experiência mostra que depois que as Equipes Comerciais estiverem devidamente ajustadas, o resultado da Fusão deverá significar preços mais elevados para as Sementes e o estabelecimento de condicionantes comerciais, entre eles a famigerada “Venda Casada”.

Espero estar enganado, mas alguém duvida disso?


Não me surpreenderia ouvir comentários do tipo: “Quem não levar o pacote da Bayer, não terá o Roundup e nem as Sementes da linha Monsanto. Se quer, quer. Se não quer, tem quem queira”.

Alguém já escutou algo do gênero ou é uma viagem da minha cabeça?

Segundo informações de Revendedores Bayer, a companhia já condiciona as compras de uma quantidade determinada de produtos do portfolio, cuja rotação é baixa, para garantir a entrega do Fungicida FOX (carro-chefe das vendas). Essa prática é bem conhecida no Mercado.

Nessa altura, acredito que muitos Revendedores Bayer e Monsanto pelo Brasil afora devam estar alternando-se entre comemorações e angústias. Alguns se tornarão muito fortes e outros perderão a “bandeira”, ainda que representada há anos, pois não haverá como justificar-se a co-existência de canais concorrentes em várias regiões importantes.

No tocante ao Agricultor, o cenário é ainda mais complexo na medida em que as suas opções de escolha estarão reduzidas e sujeitas a condicionantes que certamente irão limitar a autonomia na condução das lavouras.


IV – Prováveis Conseqüências de Longo-Prazo

Infelizmente, não tenho a famosa “Espada de Thundera” para ver além do alcance, mas algumas conseqüencias prováveis se desenham num horizonte não tão distante:

a)  Os Produtores de grãos no Brasil e no resto do Mundo se tornarão ainda mais dependentes, não sendo devaneio pensar que muitos se tornarão verdadeiros “integrados”, nos moldes que já ocorre há anos no setor de Frangos e Suínos. Será difícil saber se a atividade agrícola existe em função do cultivo ou se é apenas uma aplicação a mais onde se usa um determinado “pacote tecnológico”;

b)   As margens na Agricultura serão drenadas com maior vigor em direção a um pequeno grupo de gigantes da area de insumos;

c) Com o Poder Econômico estabelecido pelos Conglomerados, incluíndo Syngenta/Adama controladas pela Chem-China e a fusão entre Dow-Dupont, os Governos e suas Agencias Reguladoras enfrentarão uma enorme pressão para que as regras do jogo estejam alinhadas aos interesses desses grandes grupos. Em certa medida, essa situação já acontece no Brasil há pelo menos 10 anos, onde o Consórcio MAPA-ANVISA-IBAMA impedem através da burocracia o estabelecimento de uma maior concorrência no setor de Defensivos Agricolas;

d)    A China poderá liberar o plantio de Soja GMO, o que poderá incrementar a produção em mais de 10 milhões de toneladas/ano, considerando-se a manutenção da area cultivada atualmente e adicionando-se o diferencial de produtividade que a tecnologia permite;

e)    A China deverá tornar-se auto-suficiente na produção de Milho e deixará de importar;

f)   A India, que atualmente produz Soja Convencional para o consumo domestico, poderá também liberar o plantio de sementes GMO e tornar-se mais um abastecedor do sudeste asiático, diminuindo a dependência da região em relação aos Estados Unidos, Argentina e Brasil;

g) Possibilidade concreta de que alguns países da Africa com grande potencial produtivo, mas que por questões ideológicas ainda proibem o plantio de sementes transgênicas, venham a liberar a tecnologia e se tornem auto-suficientes em Milho e derivados;

V) O que Podemos Fazer diante desse Cenário?

Em primeiro lugar, afastar o “Vitimismo dos Pedintes Profissionai” do nosso Ramo, pois a Era dos Subsídios acabou.

Agricultura é um negocio para gente Competente e não terá mais espaço para Improvisados, tampouco para “Chorões”.

Temos de encarar o negocio da Bayer com a Monsanto como parte de uma evolução normal do Mercado e nessa esteira virão outros semelhantes.

Me parece que devemos estruturar com urgencia um conjunto de medidas importantes para proteção dos interesses do Setor:

1)  Formação de Grupos de Compra, seja na forma de Cooperativas, Condomínios, Associações ou Pools como mecanismo para melhorar o processo negocial;

2)    Pressionar fortemente o Governo para que modifique rapidamente a legislação de insumos, permitindo que os Agricultores organizados possam importar diretamente, que a sua vez se responsabilizarão pelo uso correto no campo e o devido descarte das embalagens;

3)  Implantação de Programas de Capacitação em Gestão Administrativo-Financeira para que os Agricultores possam defender o crédito para suas atividades, de maneira consciente e organizada, evitando-se as armadilhas negociais e a aceitação de condições desfavoráveis de fornecimento simplesmente porque estão oferecendo um Prazo extendido de pagamento;

4)  Criação de um Banco e de uma Seguradora com Capital integralizado exclusivamente por Agricultores, de atuação regional, com gestão profissionalizada e regras rígidas para concessão de crédito obedecendo os parâmetros do Mercado;

5)    Incentivar a formação de Clusters Agroindustriais voltados para agregação de valor da produção;

6)  Desoneração dos impostos incidentes sobre insumos diretos, nos combustíveis e produtos alimentícios voltados para o consumo domestico e para exportação;

7)    Fixação de uma tarifa única e de valor acessível para todas as operações que exijam validação cartorial;

8)    Criação de uma tabela progressiva de Impostos incidentes sobre as operações de Arrendamento de Terras, estabelecendo valores maiores para contratos de curta duração até a isenção a partir de períodos superiores a 10 anos. Essa medida tem por finalidade favorecer o Arrendatário que sabe produzir, trazendo-lhe segurança operacional, financeira e juridica para realização dos investimentos. Isso favorecerá significativamente o setor com a redução da percepção de risco e dos juros cobrados nos financiamentos, além de minimizar os efeitos deleterios da lavagem de dinheiro e da especulação imobiliária com áreas produtivas.


Me parece que a transação bilionária feita pela Bayer-Monsanto pode ser encarada como uma grande Oportunidade de mostrarmos que o Setor está preparado, não é passivo e que poderá ser um excelente parceiro, se esse novo Conglomerado estiver realmente imbuído das boas intenções manifestadas ao Mercado.


Fonte: CustodoAgro – Consultoria Agrícola – Eduardo Lima Porto